Bitcoin e o case Somalilândia: Como será o nosso futuro com moeda virtual?

Bitcoin e o case Somalilândia: Como será o nosso futuro com moeda virtual?

Como podemos viver sem dinheiro? Não, eu não estou falando da nossa conta bancária no fim do mês, estou falando em viver sem dinheiro físico. Segundo o Fórum Econômico Mundial, a Suécia pode parar de usar dinheiro em espécie até 2023, mas a Somalilândia, um país com orçamento de US$ 250 milhões e sem crédito no FMI, praticamente deixou de utilizar o papel moeda. Em paralelo, para apimentar a discussão, temos as criptomoedas, como o Bitcoin, e a polêmica do mercado negro. Sim, são muitos jogadores e vários cenários, por isso, vamos separar em partes e tentar entender como será o nosso futuro e a relação com o dinheiro.

Você provavelmente já ouviu falar em Bitcoin. Para muitos, ela é sinônimo de criptomoeda, mas não é bem assim. Existem várias criptomoedas – acredita-se que cerca de 3 mil variações e todas usando a mesma base; a criptografia em Blockchain, ou seja, uma espécie de livro de registro eletrônico que compila todas as transações. Parece complicado, mas não é. Imagine que você tem 100 moedas e divide entre 5 amigos. Todas as transações entre eles são registradas em um livro (Blockchain). No entanto, ao invés de escrever “Pedro transferiu 10 moedas para Marcos”, o Blockchain registra como “carteira #0002 transferiu 10 moedas para carteira #0004”, ou seja, o livro é público, mas você não sabe quem tem os valores e sabe que existe um limite de moedas no mercado. No caso do Bitcoin, existem apenas 21 milhões de BTC – sendo que 80% está em circulação – e muitas carteiras possuem apenas um Satoshi (a menor fração do Bitcoin e que vale 0,00000001 BTC).

No entanto, todo esse anonimato transforma as criptomoedas em um cenário fértil para a ilegalidade. Como não há nenhum tipo de declaração, o Bitcoin (ou qualquer outra criptomoeda) vira oportunidade para sonegação e foge do controle do governo. Vejamos o exemplo da Venezuela. Com inflação de 1.400% ao ano e câmbio controlado pelo governo de Nicolás Maduro, muitos venezuelanos estão recorrendo a mineração de Bitcoins. O volume tem sido tão grande, que o próprio governo do país tem trabalhado para desenvolver a sua própria criptomoeda. Em parceria com a Onixcoin, o Banco Central da Venezuela tem trabalhado em uma solução local para ter a sua própria moeda digital.

“qualquer moeda precisa de estabilidade e transparência, caso contrário, você terá todas as atividades ilegais do mundo” – Ajay Banga, CEO da Mastercard

Essa falta de controle e instabilidade na cotação (só em 2017, o Bitcoin teve ganhos acumalados de 424% ao ano) faz com que figurões do mercado ataquem as criptomoedas. O presidente da Mastercard, Ajay Banga, declarou que as criptomoedas são “lixos”. De acordo com o executivo, “qualquer moeda precisa de estabilidade e transparência, caso contrário, você terá todas as atividades ilegais do mundo”. Ele ainda completa “se o governo criar uma moeda digital, encontraremos uma maneira de entrar neste jogo. Nós fornecemos trilhos para mover a moeda do cliente para o comerciante. As moedas digitais exigidas pelo governo são interessantes”.

Mas nem tudo é ilegalidade no mundo das moedas digitais. Conforme comentei no começo do texto, a Somalilândia é um case que merece ser estudado. Com inflação e câmbio nas alturas (são necessários 9 mil shilings para comprar USD 1), comprar um produto exige – literalmente – um caminhão de dinheiro. A solução encontrada foi transformar valores em créditos.

Da mesma forma que funcionam as moedas virtuais em games, empresas como a e-Dahab e Zaad transformaram as transações da Somalilândia em uma “troca de créditos”. Para efetuar um pagamento, basta digitar alguns números e um código exclusivo de cada vendedor. Esses números estão escritos por toda a parte – em barracas de rua ou mesmo lojas mais luxuosas da região. Por não usar internet (o sistema funciona como um crédito de celular) e o país ter uma penetração de celulares na casa dos 88% (62% em áreas rurais), o sistema de transferência via celular se popularizou. Isso não acontece só por lá. A onda dos pagamentos online tem invadido países como Tanzânia, Uganda, Gana e Quênia, neste último, quase metade da população usar o M-Pesa, um sistema semelhante ao da Somalilândia e fornecido pela britânica Vodafone.

Agora que já vimos exemplos interessantes na África subsariana, vamos falar das moedas digitais na Suécia. Um país com PIB per capita de 51.599,87 USD (para efeito de comparação, o do Brasil é de 8.649,95 USD) e onde apenas 18% das transações envolvem dinheiro em espécie. Por que a Suécia não parou de usar papel moeda ainda? Além da questão cultural – algumas pessoas ainda preferem a boa e velha moedinha física – e o medo de cibercrimes, existe o fato que turistas e imigrantes podem encontrar dificuldade em operar em uma sociedade sem moeda física. Afinal, deixamos de lado o papel moeda, mas abrimos espaço para os smartphones e outras tecnologias. Já para países como a Somalilândia, o fim da moeda física tem outro agravante, por terem uma economia fragilizada, os países deixam de usar a própria moeda e passam a usar o dólar, aumentando a dependência em relação ao sistema americano. E isso, no curto, médio ou longo prazo, tem impactos significativos na independência de pequenos países.

Se fosse arriscar uma resposta para a nossa pergunta inicial, eu diria que viveremos sem dinheiro físico um dia. Talvez ele seja uma mistura de criptomoeda e cartão de crédito, mas com regras específicas para câmbio. E você? Qual a sua opinião?

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