Por que Barcelona decidiu acabar com os aluguéis de curta duração

Por que Barcelona decidiu acabar com os aluguéis de curta duração

  • • Por que Barcelona decidiu restringir os aluguéis turísticos e acabar com licenças até 2028.
  • • Quais são os impactos do turismo em excesso no dia a dia da cidade e na crise de habitação.
  • • O que outras cidades do mundo fizeram e quais resultados já apareceram após medidas parecidas.

As manhãs em Barcelona sempre começam com barulho de rodas nas calçadas: malas cruzam becos antes do sol. Nos últimos anos, essa cena deixou de ser exceção de alta temporada e virou rotina. A capital catalã, antes celebrada por sua beleza e energia, tornou-se também exemplo de algo mais complicado: como o turismo em excesso pode transformar uma cidade por dentro.

Por isso, o anúncio feito pela prefeitura em 2024 foi direto e surpreendente. Barcelona decidiu acabar com os apartamentos turísticos como conhecemos. Não é exatamente um “banimento” imediato, mas sim um cronograma claro: até novembro de 2028, nenhuma licença de aluguel de curta duração será renovada. A cidade quer que esse tipo de imóvel desapareça aos poucos.

Desde 2025, novas licenças já deixaram de ser emitidas em muitos bairros. Quem ainda tem autorização pode continuar operando até o fim do prazo. Depois disso, o plano é devolver esses imóveis ao mercado de moradia para quem vive na cidade. Isso vale para apartamentos inteiros alugados por dias ou semanas, geralmente via plataformas como Airbnb. Hotéis e hospedagens tradicionais continuam autorizados, desde que cumpram as regras do setor.

A proposta original de plataformas como o Airbnb surgiu dentro da lógica da economia colaborativa. Mas, com o tempo, esse modelo foi sendo apropriado por investidores que passaram a operar dezenas de imóveis ao mesmo tempo, transformando bairros inteiros em zonas turísticas permanentes. O problema não está na tecnologia, mas no desvio de finalidade.

Mas por que tomar uma medida tão drástica?

A resposta passa por dois problemas interligados. O primeiro é a crise de habitação. Barcelona viu seus aluguéis dispararem nos últimos anos. Muitos moradores foram forçados a sair de seus bairros, enquanto imóveis antes residenciais passaram a ser usados só para turismo. Com menos oferta, os preços subiram, e a cidade virou um campo de batalha entre quem mora e quem visita.

O segundo problema é o “overtourism”. A presença constante e massiva de turistas mudou o ritmo da cidade. Bairros tradicionais perderam serviços locais, vizinhanças viraram vitrines, o convívio urbano se tornou mais difícil. Ruídos, festas, lixo, uso excessivo da infraestrutura. Em alguns pontos, o cotidiano virou inviável.

Barcelona não está sozinha. Cidades como Nova Iorque, Amsterdã, Florença e Montreal adotaram medidas semelhantes nos últimos anos. Todas enfrentam o mesmo dilema: como equilibrar turismo e vida local?

O que Barcelona espera com isso (e o que outras cidades já conseguiram)?

O que Barcelona espera é simples de dizer, mas difícil de alcançar: uma cidade mais habitável. O objetivo da prefeitura é frear a transformação dos bairros em zonas exclusivamente turísticas e devolver a cidade a quem mora nela.

A medida busca, principalmente, aumentar a oferta de moradias permanentes, reduzir os preços dos aluguéis e reequilibrar o uso dos espaços urbanos. Também é uma tentativa de proteger a identidade dos bairros, preservando o comércio de proximidade e as relações de vizinhança.

Se vai funcionar, ainda é cedo para dizer. Mas experiências em outras partes do mundo dão pistas. Em Chicago, por exemplo, a regulação levou a uma queda de mais de 16% no número de anúncios de curto prazo, o que ajudou a estabilizar parte do mercado de moradia. Amsterdã e Florença, ao limitarem ou proibirem novos aluguéis turísticos em áreas históricas, viram uma desaceleração na “turistificação” de seus centros. Montreal, ao restringir a temporada de aluguéis temporários, conseguiu diminuir o número de imóveis operando fora das regras.

É verdade que os efeitos nem sempre são imediatos. Em Nova Iorque, mesmo com leis rígidas, os preços dos aluguéis seguem altos, o que mostra como o mercado imobiliário é complexo.

Mas o que essas cidades revelam é que limitar o uso turístico dos imóveis é, no mínimo, um passo para frear a especulação e proteger a vida urbana. Sem uma ação coordenada, o risco é deixar que a lógica do turismo determine quem pode ou não viver em determinadas áreas. E Barcelona é mais uma cidade que está tentando evitar esse destino.


Créditos: Imagem Destaque – Songquan Deng/Shutterstock

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