IPCC afirma que ações contra mudanças climáticas são urgentes

IPCC afirma que ações contra mudanças climáticas são urgentes

Divulgado no início de agosto (09), o novo relatório sobre mudanças climáticas do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) — organização científico-política criada em 1988 pela iniciativa do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e da Organização Meteorológica Mundial — traz um cenário complicado para os próximos anos, com as mudanças climáticas se intensificando.  

Apesar da comunidade científica alertar há anos sobre as consequências, talvez seja complicado entendermos a proporção dos impactos deste cenário quando são representados por relatórios como este (muitos deles são técnicos e com gráficos nada amigáveis). Por isso, quero fazer este texto de uma forma diferente, trazendo exemplos do que já temos sentido nos últimos anos.

Não muito antigamente, os cientistas chamavam as mudanças climáticas de aquecimento global. No entanto, o “aquecimento” não era só aquecimento (parece redundante, mas vou explicar). O aumento na temperatura do planeta gera uma infinidade de eventos — por exemplo, frio mais intenso, como visto no inverno deste ano no Brasil — e, por isso, decidiram mudar a terminologia para mudanças climáticas.

Os últimos 8 anos foram os mais quentes já registrados e a temperatura do planeta já aumentou 1,07° C em relação ao período pré-industrial (1850-1900). Isso significa que estamos próximo do limite. Quando o último relatório do IPCC foi publicado, em 2013, foi considerado o limite de aumento 1,5° C como a última alternativa. Para isso, as emissões de CO2 precisam ser reduzidas pela metade até 2030 e zeradas até 2050. No entanto, o novo relatório mostra que, independente das nossas ações no cenário atual, atingiremos o limite em 2040.

“O limite de 1,5° C é um limiar importante, é claro, mas de um ponto de vista climático, não é a borda de um penhasco — como se, assim que esse limite 1,5° C for ultrapassado, de repente tudo se tornará muito catastrófico. Não vai ser assim repentino”, explica Amanda Maycock, da Universidade de Leeds, uma das autoras do novo relatório.

A grande questão é que o aquecimento (e suas consequências) são causados por nós. Em nenhum cenário, a Terra sofreria essa mudança climática sem a atuação do homem. Além disso, o relatório do IPCC mostra que, caso as emissões de CO2 sejam reduzidas com maior rapidez, mesmo assim, ainda pode levar até 30 anos para que as temperaturas se estabilizem.

“A gente não está mais discutindo se o homem foi um fator ou se é o um fator preponderante nas mudanças climáticas. Não se discute o “se”, mas o “quanto”. É inequívoca a influência humana no clima da Terra e eles (IPCC) agora mostram quanto conseguem estimar em graus de temperatura”, afirma Stela Herschmann, especialista em política climática do Observatório do Clima.

Quer um exemplo simples da nossa atuação e do Efeito Borboleta que causamos no meio ambiente? Se você estava em São Paulo no último domingo (22), percebeu que algumas regiões receberam uma “chuva” de cinzas. Devido à queda de um balão, o Parque Estadual do Juquery, área de preservação e único remanescente de Cerrado da Região Metropolitana de São Paulo, foi acometido por um enorme incêndio e, somado ao tempo seco e ventos, diversos bairros da capital paulista viram fuligem e cinzas chegaram a mais de 30 km de distância. Um “simples” balão devastou mais de 50% da área de preservação e impactou milhares de casas na maior cidade da América Latina. Deu para entender o exemplo de causa e efeito no meio ambiente?

A destruição de reservas e dos biomas brasileiros é uma questão que temos visto se acentuar nos últimos anos e pode colocar o país em uma situação desconfortável nos próximos anos. Segundo o Estadão, “menos de um mês antes (da divulgação do relatório do IPCC), um estudo publicado na revista Nature mostrou que algumas áreas da Floresta Amazônica já emitem mais dióxido de carbono do que absorvem. A pesquisa foi liderada por Luciana Gatti, do Inpe (Instituto Nacional de Investigação Espacial), órgão do Ministério da Ciência e Tecnologia, e não foi parte das análises do relatório do IPCC por ter ficado pronta pouco tempo antes.” — leia a entrevista completa com a cientista neste link.

Voltando ao relatório do IPCC, mesmo se pararmos de devastar a natureza, controlarmos as emissões de CO2 e nos mantivermos dentro do limite de 1,5° C, os oceanos continuarão a subir até 2 metros nos próximos 80 anos, outro impacto das mudanças climáticas. Você lembra a fala que citei acima, de uma das autoras do relatório do IPCC? Nada vai acontecer de repente.

Segundo Satyendra Prasad, embaixador de Fiji e representante permanente da ONU, para o jornal The Guardian, ”veremos mais salinidade e um aumento do nível do mar, o que significa que lugares como Kiribati, Vanuatu e as Ilhas Salomão se tornarão inabitáveis”. De acordo com Valérie Masson-Delmotte, co-presidente do grupo de trabalho do IPCC que produziu o novo relatório, “com o aumento gradual do nível do mar, os eventos extremos que ocorreram no passado apenas uma vez por século ocorrerão com mais frequência no futuro”.

O lançamento do relatório do IPCC próximo ao acontecimento da COP26, que será realizada em novembro em Glasgow, na Escócia, significa que provavelmente ele será a base para as novas negociações sobre o clima. O IPCC tem histórico nesse ponto; em 2013 e 2014 os relatórios prepararam o caminho para o acordo climático de Paris. Além disso, o COP25 deixou alguns pontos não resolvidos, entre eles os impactos do aumento do nível do mar submergindo pequenas nações insulares (veja só!), enquanto secas e ondas de calor estão provocando quebras de safras.

A prioridade da COP26 será fazer com que os países se comprometam a zerar as emissões de carbono até a metade deste século, com cortes mais agressivos a partir de 2030. No entanto, serão discutidas as chamadas “soluções baseadas na natureza”, ou seja, usar a natureza para resolver alguns dos desafios climáticos — como a absorção de carbono ou o plantio de arbustos e árvores como proteção contra eventos climáticos extremos como enchentes ou tempestades de areia.

Um exemplo desta abordagem é a Grande Muralha Verde da África. O projeto, criado em 1952 pelo ambientalista Richard Baker e composto de acácias (árvores resistentes à seca), tem como objetivo construir uma “muralha verde” de 7.500 quilômetros de comprimento e 14 de largura, com o objetivo de bloquear o vento e a areia que vem do Saara.

O problema é que a Grande Muralha Verde caminha a passos lentos e pouco andou desde 2007. Por questões que vão de cenários políticos complexos na região, até falta de iniciativa privada e pública, é de se esperar que a COP26 crie ações que impulsione projetos como este pelo mundo. No âmbito da ciência, uma opinião é quase consenso: A mudança climática não está mais na nossa porta… ela já derrubou a porta e temos que agir urgentemente.

Imagem Destaque: mkfilm/Shutterstock

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