A inovação social na África e o microfinanciamento – Parte 2

A inovação social na África e o microfinanciamento – Parte 2

Na nossa segunda parte sobre inovação social na África, vamos focar em outros três pontos importantes da região e como o microfinanciamento tem mudado o mercado africano. Começando pela água, higiene e saneamento. Segundo o Innovative Finance in Africa Review, relatório desenvolvido pelo Centro de Inovação Social e Empreendedorismo Bertha, da Universidade de Cape Town, e que tem sido base para este texto, cerca de 750 mil pessoas não possuem acesso a água potável no mundo. Deste número, 43% são pessoas que vivem na África Subsaariana.

  1. O acesso à água e saneamento básico

Ironicamente, em um planeta onde 71% da superfície é coberta por água, o elemento vital para a vida também é um grande negócio. Estima-se que o mercado de água gira em torno de US$ 360 bilhões e tem crescimento entre 4-5% ao ano. Fazendo um comparativo, seria necessário US$ 190 bilhões em investimento para levar água potável e saneamento básico para todo o continente africano.

No entanto, a Sanergy é uma empresa que tem contornado esta necessidade de investimento e levado soluções de saneamento sustentável e dignos para moradores de Nairóbi, capital do Quênia. Na cidade mais populosa da região, a Sanegy desenvolveu e produziu banheiros sustentáveis que funcionam com cartuchos reutilizáveis.

Investimento e o Modelo de Negócio: Os cartuchos de lixo (algo parecido com tambores de plástico) são recolhidos regularmente, transportado para uma central especializada e transformados em fertilizantes ou energia elétrica. Além disso, a Sanergy funciona no formato de franquias para microempreendedores, que contam com empréstimos sem juros por meio de uma parceria da Sanergy e Kiva, um programa de microcrédito on-line. Em 2013/2014 a empresa recebeu US$ 5 milhões de investimento da Fundação Bill & Melinda Gates.

  1. O acesso à energia renovável por meio de energia solar

Se energia elétrica já é um desafio em cidades do interior de alguns Estados brasileiros, imagine na África Subsaariana. Por lá, apenas 24% da população possui acesso à energia elétrica e a média do custo de quilowatt/hora é de US$ 0.13 (muito acima da faixa entre US$ 0.04 – 0.08 de países desenvolvidos).

A M-Kopa é uma empresa especializada em energia solar que tem como missão levar energia elétrica para todos. A empresa desenvolve, produz e financia grades solares para famílias de baixa renda. Por operar em um mercado onde a maioria das famílias dependem de iluminação à base de querosene (nocivo para a saúde e o meio ambiente), a M-Kopa tem vantagem competitiva ao oferecer uma alternativa de baixo custo que fornece energia limpa, segura e confiável para iluminar e alimentar residências.

Investimento e o Modelo de Negócio: A M-Kopa vende produtos solares para famílias de baixa renda por meio de um plano de pagamento por uso. O sistema, proprietário da empresa, usa tecnologia GSM e não requer instalação. Basicamente o M-Kopa III é um kit de energia solar que inclui um sistema de 8 watts, bateria, duas luzes LED com interruptores, lanterna, carregador USB para celulares e um rádio portátil. Os clientes interessados pagam US$ 35 pelo kit e podem adquirir créditos de uso diário por US$ 0.45. Uma das vantagens para o cliente é que, após um ano de uso, o kit passa a ser do cliente e ele pode usar o sistema gratuitamente ou atualizar para um sistema com mais capacidade energética.

Atualmente a M-Kopa conecta mais de 400 mil casas. Calcula-se que isso represente 50 milhões de horas a menos de iluminação por querosene. Como investimento, a empresa já recebeu diversos incentivos e hoje possui aproximadamente US$ 45 milhões em fundos de capital.

  1. A agricultura em um cenário de fome

A agricultura é a “indústria” mais antiga que se tem notícia no mundo. O investimento em agricultura é, muitas vezes, um caso econômico simples de oferta e procura. No entanto, a agricultura como conhecemos atualmente são grandes indústrias e os pequenos agricultores se enquadram em um limbo econômico. São muitos grandes para microfinanciamento e muito pequenos para empréstimos bancários tradicionais.

Ironicamente, o Banco Mundial estima que o crescimento do setor agrícola é duas vezes mais eficaz na redução da pobreza (aqueles que vivem com menos de US$ por dia) do que outros setores. Mas como fazemos para fechar esta conta, então?

A Root Capital, empresa de crédito agrícola sem fins lucrativos, fornece financiamento e capacitação de pequenos e crescentes negócios agrícolas que operem em áreas rurais e pobres da África, Ásia e América Latina. Outra empresa sem fins lucrativos e que também opera no setor é a One Acre Fund, uma instituição focada na África Oriental e que fornece, além do financiamento, treinamento em técnicas agrícolas e funciona como uma facilitadora de mercado para maximizar os lucros das vendas da colheita.

Conclusão: O microfinanciamento como agente transformador de mercado

Após conhecermos estes seis cenários, já poderíamos dizer que o microfinanciamento é um mercado em expansão na África, mas os números só reforçam ainda mais. Em 2009, o microfinanciamento cresceu 45% na África, bem acima da média mundial que, no mesmo período, cresceu apenas 22%. Este movimento vem desde 2004 e atualmente atende mais de 16 milhões de depositantes e 6.5 milhões de mutuários (recebedor). Em um cenário onde 80% da população adulta não possui acesso a serviços financeiros, é incrível ver como a economia e a inovação social se uniram para gerar um mercado em crescimento.

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